A notícia era cruel: “a fábrica vai fechar as portas em alguns meses”. E agora? Qual deve ser o papel da comunicação interna nesse cenário? Conheça a história de uma indústria que fez da comunicação interna uma ferramenta estratégica de gestão diante de uma situação crítica e, assim, conseguiu reduzir, para empresa e trabalhadores, os impactos negativos desse processo
Era uma vez uma indústria de autopeças na periferia do Rio de Janeiro,
que empregava diretamente quase 500 pessoas. O grupo nacional que era dono
dessa fábrica concluiu que seria melhor para os negócios transferir a produção
carioca para as suas unidades fabris em São Paulo. Entre as providências
tomadas para levar a cabo essa decisão, foi contratada uma consultoria, para
orientar sobre como o encerramento das atividades deveria ser feito. E veio a
orientação: dia tal, a fábrica amanhecerá de portões fechados. Até lá, tudo
deverá ser feito normalmente, sem nenhum aviso aos empregados. Era assim que
muitas outras empresas já haviam feito. A principal argumentação para conduzir
o processo desse jeito era a dificuldade que o sindicato criaria, as greves que
viriam, talvez até quebra-quebras, sabotagens e danos ao patrimônio da empresa.
E não tinha jeito, iria fechar mesmo, então, que fosse de uma vez.
O principal executivo da fábrica a ser fechada era um gringo de poucas
falas, bastante experiente e cujo emprego nem de longe estava ameaçado pelo
fechamento da fábrica – ele voltaria para São Paulo, onde integrava o staff de
ouro do grupo. Ele se posicionou contra todos os seus pares e contra a veemente
orientação da consultoria para se fazer a coisa assim, às escondidas. Mais do
que isso: ele se indignou. Afinal, fazia uns três anos que ele havia sido
designado para ‘tocar’ aquela fábrica e estava decidido a não enganar seus
funcionários. Sua inabalável convicção, o prestígio conquistado em anos de
serviços prestados ao grupo e muita negociação levaram a uma nova decisão: o
processo de fechamento seria feito às claras. A consultoria entrou em
pânico. “Isso é loucura”, afirmavam.
Aí entrou em cena a comunicação. O gringo não apenas conhecia o seu
pessoal, mas também se relacionava com ele, com o apoio da área de comunicação
interna e de alguns canais implantados desde a sua chegada. Esse trabalho foi
intensificado. Quadros de avisos, boletins, eventos de portas-abertas,
reuniões, tudo foi usado para transmitir aos trabalhadores a consideração e
confiança que mereciam. Além disso, ele se expôs várias vezes, subindo nos
degraus do Almoxarifado e, microfone na mão, colocando o pessoal a par do
andamento do processo. Não se escondia: andava pela fábrica e interagia com os
trabalhadores, mesmo falando pouco e baixo, era transparente e objetivo.
Foram vários meses desde o anúncio oficial aos empregados até o
fechamento da fábrica carioca. A produção continuou ativa por vários desses
meses, para que não faltassem peças no período entre o seu fechamento e a
retomada da produção em São Paulo. Fatos surpreendentes aconteceram,
resultantes da prática efetiva da comunicação, e dois deles merecem destaque: o
primeiro foi que, nesse período, a fábrica carioca bateu seu recorde de
produção; o segundo foi a parceria estabelecida com o sindicato, que
compartilhou seu mailing de empresas do setor, para as quais foram enviados
books de currículos preparados pela empresa. Isso ajudou a recolocar vários
profissionais.
Alguns empregados demonstraram interesse em abrir negócios próprios, com
a experiência que tinham e a indenização que receberiam. A empresa, então,
chamou o Sebrae para orientar esse grupo. Um cronograma de dispensas divulgado
nos canais de comunicação internos permitiu que os trabalhadores se preparassem
para o desligamento, e muitos deles, inclusive, ajudaram a transferir as
máquinas e a reiniciar a produção em São Paulo.
Foi muito difícil, mas nem se compara a chegar para trabalhar e dar de
cara com um portão lacrado e um aviso de demissão coletiva colado no muro.
Muito tempo e muitos recursos foram investidos, sim. Pacotes financeiros,
negociações. Mas nenhum lote sabotado foi produzido. Nenhum dano foi causado à
imagem da empresa. Nenhum minuto foi perdido com greve.
O sindicato fez seu trabalho de negociar um bom pacote de benefícios
para os demitidos. E a empresa fez a sua obrigação de pagar a todos dentro da
lei. Mas o dinheiro nunca seria satisfatório se faltasse esse relacionamento
estabelecido por meio da comunicação interna.
Esta história é verídica e a empresa ainda existe, foi vendida e
cresceu. E a consultoria que queria bater a porta na cara dos empregados? Não
existe mais faz tempo...
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